Quando somos jovens perdemos a inocência e a capacidade de deslumbramento - típicas do tempo em que éramos crianças. Quando somos adultos perdemos alguns sonhos que inventariamos na juventude. Quando somos velhinhos perdemos a alegria de viver intensamente.
E em qualquer idade perdemos o entusiasmo perante os resultados maus, perdemos a coragem para assumir as fragilidades, perdemos oportunidades, perdemos as pessoas de quem gostamos. Em qualque fase da vida, não sabemos lidar com a adversidade, pese embora ela seja uma constante inevitável.
É difícil lidar com as faltas, com as ausências, com as derrotas, mas sobretudo com as perdas irreversíveis. Mas é inviável acreditar que essas perdas serão colmatadas com outros ganhos, é de todo inconcebível! Por muitos projectos, pessoas que entrem nas nossas vidas, por muitas ambições que venhamos a ter, houve sempre um tempo em que tudo foi diferente e tudo o que era desse tempo é insubstituível. Então, porquê tentar contrariar isto?
Não podes pedir a vassalagem do meu amor quando é o teu orgulho que se assume como suserano. Quero a paz que um dia vieste inquietar com a tua presença. Volta-me a deixar com a força necessária para permanecer no meu cantinho - não posso voltar a deixar que alguém o invada!
As novas feridas doem mais (já que as velhas nunca ficam verdadeiramente cicatrizadas!). E quando as novas têm necessariamente que sarar, é complicado fazer com que isso aconteça. O tempo não passa com a mesma velocidade de quando assistia aos momentos de felicidade que antecederam o actual estado de sítio. Há feridas que cicatrizaram mal porque não foram devidamente desinfectadas. A ferida que tu me deixaste como memória viva de ti, vai ser cuidadosamente desinfectada com um bálsamo de tolerância e vai ser seca com o mercúrio do afastamento. Quando começar a cicatrizar correctamente, a memória viva, ficará embalsamada, sem qualquer intervenção, completamente estática e inoperante relativamente a decisões a tomar.
Sim, a mágoa é agora a recordação que tenho da tua fugaz presença na minha vida. Precisei de ti, precisei do teu abraço apertado, precisei da tua mão a agarrar a minha. Sei que ainda preciso. Porém, a dor que me exalta o coração não deixa sentir os efeitos destes gesto que quando são puros, sinceros e genuinamente sentidos, valem por muito, quando não o são, deixam apenas a angústia de ter acreditado que seriam eternos (enquanto cremos na eternidade como aquilo que podemos perpetuar sem depender de tudo o resto, mas apenas de nós).
“Até logo, tristeza – autobiografia de uma depressão”, de Assumpta Roura
É duro enfrentar a traição de um amigo. Sendo uma pessoa na qual confiamos, a sua traição causa-nos uma tristeza enorme. Por algum tempo, somos incapazes de fazer o nosso coração ressurgir dos destroços. Além da tristeza, cresce em nós um sentimento de vingança ou, então, um ressentimento profundo. Contudo, percebemos que não podemos fazer nada para voltar atrás, que esse amigo não pode corrigir o erro que fez e do qual se arrependeu, então deixamo-nos comover, ficamos sensibilizados e deixamos sobreviver a necessidade que temos dessa amizade. Podemos não perdoar, mas conseguimos passar à frente. Segue-se a reconciliação que é tanto mais fria quanto mais grave foi a traição. A pouco e pouco, a jogar a favor do tempo, voltam a proximidade e a cumplicidade - não iguais ao que foram um dia (pois há coisas que não se esquecem). Mas o importante é que voltam a ser de alguma maneira.
Quando falhamos, sentimo-nos profundamente tristes, vemos as nossas expectativas defraudadas, os nossos esforços irreconhecíveis, o nosso empenho menosprezado, a nossa persistência desvalorizada. Temos duas alternativas: desistir ou reunir as derradeiras forças, pegar outra vez nas armas e ir à luta. Creio que há situações em que é desnecessário voltar a insistir, a menos que se pretenda acumular fracassos sucessivos.
Se o amor que alguém sente por nós se revela insuficiente ou pouco duradoiro, ficamos tristes, entregues a doces lembranças. Até que, novamente, por acaso, sem darmos por isso, surge outra pessoa com um amor maior para nos oferecer. Podemos sentir medo de sofrer outra vez, todavia podemos também ignorar o medo e aceitar arriscar mais uma vez.
Há 1001 razões para nós sentirmos tristes, por várias razões (umas mais importantes que outras, porém quer umas quer outras têm igual legitimidade) ou por nenhum motivo. Sentimo-nos apenas tristes. Podemos procurar o conforto nos braços de alguém ou encontrá-lo junto de nós próprios, numa solidão sentada à beira de nossa vida.
Pedimos os máximos, mas, na verdade, parece que até os mínimos são inalcançáveis para nós. Crescemos; contudo, as nossas pernas ainda não têm o tamanho suficiente para pular mais alto e conseguir agarrar os ideais que se penduram na torre da realidade longínqua.
Queria dizer-te no presente, com o mesmo entusiasmado de dias idos, que continuo a acreditar. Porém, não te posso vender crenças que já não alimento! Já deixei de ver a luz para além das sombras que escurecem os nossos caminhos. Já me cansei de visitar a ilusão da esperança com regularidade, pois as descobertas da verdade revelam-se tão óbvias que não dão margem para as extravagâncias dos desejos.
Não seria justo apregoar que as mudanças estão para breve. O tempo arrasta-se pausadamente pelos nossos dias, confirmando-nos o quão contraditório seria crer nas mudanças.
Voltaremos um dia a ter algum tipo de fé? Precisamos das coisas que são corriqueiras para os outros, mas que para nós são verdadeiras provas de fogo (algumas inultrapassáveis!). Apesar de tudo, nós é que permanecemos agarradas a paradigmas desactualizados, viciadas numa letargia invulgar, rendidas a um optimismo infundado, passíveis perante as nossas expectativas injuriadas.
Vencemos metas que muitos desconhecem. Somos resistentes e orgulhamo-nos disso. Lutamos até ao fim por ver o eclodir das vontades mais elementares. Persistimos em objectivos importantes, todavia as rupturas não fazem parte da nossa filosofia, gostamos da continuidade. Talvez chegue um dia a hora de sermos radicais na atitude e mais firmes ainda no pensamento.
Gostava tanto que tudo tivesse sido diferente connosco ou, aliás, que tivesse antes sido tudo igual aos outros. Faz-nos falta o descontrolo trazido pelos problemas de nulidade, pelas iras de momento, pelos desatinos banais. Se tivéssemos deixado tudo isso viver em nós, provavelmente, estaríamos numa sintonia positiva…
Não consinto que me digam que estou diferente. Não, eu continuo a sentir-me a mesma de sempre, contudo sei que o meu comportamento quotidiano me desmente. Aqui não consigo sorrir de coração. Há qualquer coisa em mim que ordena que os meus lábios se esforcem por sorrir, mas meramente por uma questão de cortesia ou até por uma qualquer subtil empatia para com o destinatário.
Aqui, quando concretizo alguma tarefa não é com a devoção de quem se dedica a algo que lhe dá prazer. Tudo começa por um pequeno impulso aliado a uma forte motivação, que se vai dissipando à medida que olho à minha volta e só encontro olhares ávidos do meu insucesso, das minhas falhas, dos meus erros, das minhas capacidades.
Vou-me superando a cada dia! Quando perco a esperança, volto a semeá-la e encontro-a sempre à distância, sempre demasiado longe, mas acabo sempre por encontrá-la. No entanto, essa força de resgatar a esperança quando tudo que me rodeia se mostra tão adverso, começa a enfraquecer… Tal como tenho medo que isso aconteça, tenho pânico de não me reconhecer.
Neste mundo hostil, há sempre alguém atento aos nossos passos, esperando pelo momento oportuno para nos fazer cair. Há também aqueles a quem eu costumo designar de anjos que são os vigilantes permanentes que observam os que esperam para nos fazer cair. No momento da actuação fatal, eles estão lá para nos proteger. Se entretanto não foram a tempo de evitar a queda, conseguiram, pelo menos, que ela não fosse demasiado grave. É por isso que depois de cairmos no conhecimento de alguma verdade importante, que depois de cairmos no fracasso de um grande investimento, que depois de cairmos no fosso afectivo de ninguém, conseguimos erguer-nos, a custo e lentamente, mas conseguimos.
O tempo passa mais devagar quando se recupera de uma queda, mas os anjos continuam por aí a forçar-nos a sorrir. Tenho ainda medo que até esses anjos não me reconheçam. Mudei tanto desde que cheguei aqui que penso que se tiver de permanecer por aqui muito tempo, vou acabar mesmo por deixar de ser quem fui (ou quem sou ainda).
A pouco e pouco, o meu rosto tornou-se sisudo – expressão de uma mágoa calada, resultante da vossa indiferença. Também aos poucos fui perdendo o hábito de retribuir com boa educação. Ainda não aprendi completamente a responder com a antipatia dos egoístas, mas ando a treinar-me.
Agora evito o espelho, não por achar que estou mais gorda ou mais feia ou mais velha, mas sim porque a imagem é consideravelmente mais fria e mais distante do que antes. Há uma coisa que já há muito ninguém consegue… Ouvir-me uma gargalhada sonora, daquelas que antes ecoavam, no mínimo, meia dúzia de vezes por dia. Talvez seja a memória do tempo que vivi que me incentiva a encontrar a esperança e a ver os anjos esticarem-me a mão.
Não queria deixar de me reconhecer só por estar aqui, só por estar com vocês, só por estar neste ambiente abstracto e impessoal. Gostaria de ver o sol quando abro a persiana e saudá-lo com um sorriso, mas tenho os lábios endurecidos. Não encontro por aqui quem me mostre que é possível alguém conhecer-me... Agora sobram os fragmentos de um Antes que não volta.
Agora foco a minha atenção na enorme ponte branca. Penso nos carros que se cruzam e imagino a velocidade do andamento... Já abandonei esse ritmo frenético que não me permite debitar pensamentos em torno de actos incontidos. Por exemplo, a pressa diária de antes não me faria reparar nos sorrisos de dois velhotes com que me cruzei há pouco na rua. Só por me ter desviado ligeiramente para que eles pudessem passar primeiro, eles agradeceram com um sorriso aberto. É agradável quando um desconhecido nos saúda com um sorriso simpático (ao qual nem sempre temos tempo de retribuir, porque em vez de caminharmos, fazemos uma mini corrida de passos)...
Um dia, também eu irei passear por aqui, mais velha, mais madura, mais vivida, mais sofrida, talvez mais feliz. Terei saudades do tempo em que era jovem e me desgastei com os pequenos contratempos da vida, sem perceber que é isso que mais tarde constituirá o background do meu curriculum vitae. Provavelmente já não perspectivarei tantos sonhos como agora, mas creio que vou manter a atitude de hoje: fazer depender só de mim (e ao máximo) o meu bem-estar interior, lutando para evitar que alguém o comprometa ou que alguma tarefa o torne frágil. Esta postura mediante a vida de todos os dias trará consigo - no reverso da luta - a paz que hoje sinto, aqui, numa tranquilidade que só se percebe, que só se valoriza devidamente se vivida com serenidade.
Quando começamos um novo livro, é como partir à descoberta da essência que se esconde por entre as suas páginas. À medida que progredimos, desenhamos o perfil psicossociológico das suas personagens, identificamo-nos com certas situações, percebemos alguns sentimentos familiares, deparamo-nos com espirais de interpretações, em suma, vivemos como que “em paralelo” face à história que lemos.
Eu considero que é muito importante ler e, acima de tudo, saber ler um livro. Para tal é preciso gostar! Tarefa que não será fácil se nunca tiver havido um estímulo nesse sentido. Pessoalmente, gosto de cultivar esse gosto e, se possível, fomentá-lo nos outros. É por isso que gosto que me ofereçam livros e que gosto de os oferecer. É sempre interessante trocar opiniões, partilhar ideias sobre determinado livro, fazer recomendações de leitura.
Penso que é imperativo que os pais eduquem os filhos no sentido de os levar a descobrir o prazer da leitura. Quando são crianças e ainda não sabem ler, é aconselhável que os progenitores dispensem cinco minutos do seu tempo para ler um conto infantil, depois de lhes aconchegar a roupa na hora de dormir. Ler para uma criança é proporcionar-lhe a oportunidade de prestar atenção exclusiva às palavras e à entoação da voz. Este momento de oralidade permitirá à criança "desligar-se" das imagens que lhes passaram à frente dos olhos a maior parte do dia: na televisão, no computador, na consola. Mais tarde, quando aprendem a ler, há que encorajar as crianças, lançando-lhes perguntas como: "o que mais gostaste na história?", "a história acabou como tu imaginavas?", desta forma, motivar-se-á a criança a ler mais.
Quando pouso o livro que estou a ler na mesinha de cabeceira, apago a luz e deixo para o dia seguinte a continuação da leitura (ou porque estou cansada, ou porque tenho sono, ou porque não me apetece pura e simplesmente continuar), penso no quanto o/a escritor/a colocou de si e do seu tempo naquele enredo...
Ler (tal como escrever) é um acto solitário. Contudo, em quantos instantes de solidão a companhia ideal não passa pela leitura de um livro? A sensibilidade colocada em cada palavra, a experiência espelhada em cada citação da qual gostamos particularmente, a magia inerente a cada livro são fruto do trabalho de alguém que investiu na concepção de uma história que fizesse companhia quando e onde o leitor quiser.
Ouvimos muitas vezes o argumento de que os livros são caros e, embora não deixe de ser verdade, não é razão suficiente para que não se ler. Existem as bibliotecas públicas (muitas vezes reservadas a poucos frequentadores - os mesmos que querem cultivar e transmitir um hábito que parece perdido) e as novas tecnologias permitem o acesso a grandes obras literárias.
A digitalização de livros torna o acto da leitura diferente. Eu prefiro sentir o livro nas mãos, deixar que os meus dedos percorram as páginas. Gosto de poder desfolhá-lo, de poder pousá-lo, de poder transportá-lo comigo. Leio em qualquer sítio quando a história me entusiasma. Adoro ler na praia, ao sol ou em casa, num dia de chuva, à lareira num dia de frio e gosto de ler para alguém que goste de ouvir.
O valor do livro não reside no seu preço, mas sim na história que conta! É fulcral que, depois de quebrado o encantamento inicial com a conclusão da leitura, possamos retirar alguns ensinamentos para crescermos como pessoas e como seres humanos, algo que possa ser útil para a nossa vida.
"Apenas desejo a tranquilidade e o descanso, que são os bens que os mais poderosos reis da terra não podem conceder a quem os não pode tomar pelas suas próprias mãos."
- René Descartes -
O espelho à minha frente devolve-me a imagem de mim mesma: exausta, mas feliz, com o meu riso retumbante a propagar-se pelo silêncio do quarto e a escapar-se para a noite, através da porta semiaberta. Teclo furiosamente, com a pressa desesperada de que a noite termine para amanhã esquecer o desejo que ainda sinto de permanecer aqui.
A torrente optimista que me percorre as veias do raciocínio leva-me a acreditar que haverá sempre uma solução favorável para os problemas irresolúveis, ou para o fechamento de horizontes que se estende à nossa frente como o único cenário possível.
São estas luzes que hoje me fascinam! É esta a grande cidade que se oferece aos meus olhos sedentos de oportunidades, de novas experiências, de novos contactos, de novos encontros, de novos acasos. Porém, até que ponto tudo isto não passa de ilusões?
Estas mil e uma luzes brilhantes, que se acendem e apagam alternadamente, aqui e além, em pontos concretos na mancha escura da noite abafada, não invalidam os meus sonhos. A ânsia que tenho de vir para aqui e permanecer cresce a cada dia, em paralelo com a ansiedade de fugir daquilo que agora me oprime o livre arbítrio e me enclausura a maneira de ser num formato que me torna irreconhecível.
“Pouco importam as notas na música, o que conta são as sensações produzidas por elas.”
“Toda a música que não pinta nada é apenas um ruído.”