Conversam entre si. Trocam lamentações. Recordam o quão virtuosas foram as existências ali sepultadas e o quão injusto o seu termo. O discurso repete-se, ano após ano, e, durante esse período, a romaria parece ganhar novo fôlego, um ânimo de tal modo frenético que extenua os rituais seculares. Já não sabem respeitar o silêncio latente das campas adormecidas.
Hoje, as portas do cemitério estão escancaradas. Amanhã, já o seu peso é demasiado para as empurrar e entrar. No dia de hoje, os cemitérios ocupam uma nota na agenda das pessoas. Afluem tantos, ao mesmo sítio, que descaracterizam o sentido da visita. Em passos curtos e apressados, movem-se entre este e aquele repouso eterno dos entes queridos para colocar arranjos de flores. Muitas flores, coloridas e frescas. Ainda que a beleza das mesmas já não possa ser apreciada pelas pessoas a quem as oferecem.
Poucos conseguem olhar por muito tempo para os nomes inscritos na pedra fria sem que um arrepio lhes percorra o coração. Ali é, efectivamente, a última morada física de um ser humano. Ali, terminaremos todos. Ali, está o protagonista de uma existência, sobre a qual já caiu o pano. Acabou-se o espectáculo porque se consumiram os dias, porque findaram as emoções, as ilusões, as pulsações. Não se ouviram aplausos da plateia, pois ninguém bate palmas à tristeza da perda. Com lágrimas vertidas para dentro, discretamente no meio do alarido dos romeiros, recuperam-se fragmentos da memória que tragam momentos partilhados.
Mas os romeiros não se calam. Estão impacientes. São cansativos e perturbadores da paz tranquila que afaga estes sepulcros vazios. Vazios, sim! Pois, a par do vazio da falta que sentimos, levamos connosco a essência de quem ali está.
Patrícia, absolutamente BRUTAL... Acho que do melhor que já te li...
ResponderEliminarComo é q de um assunto tao "pesado" consegues escreve um texto tao bonito?! Usas as melhores palavras para descrever o q se sente nestes dias.. A falsa preocupação das pessoas é irritante e triste. deveriam todas ler este teu texto ;)
ResponderEliminar" ...sepulcros vazios. Vazios, sim! Pois, a par do vazio da falta que sentimos, levamos connosco a essência de quem ali está."
Demais!
Excelente! Revejo os meus pensamentos no teu texto! Acho até que vou imprimir para ler em voz alta a algumas pessoas....
ResponderEliminarFenomenal!
ResponderEliminar:)
Melani