Do remetente

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É sempre difícil escrever-lhe. As palavras enroscam-se sobre si mesmas e parece que não significam exactamente aquilo que significam noutras circunstâncias. E teimam nessa posição defensiva, obrigando-me a procurar sinónimos. 

Depois, construo as frases e apago-as quase de seguida. Nem preciso de ler para confirmar que não me interessam. Será que elas não compreendem que estão erradas? Estão transformadas numa amálgama de letras mudas, espaços em branco, parágrafos sem sentido. Enfim, não passam de manchas de caracteres indiferenciados.


Volto ao início. A custo. Pego na caneta e noutra folha de rascunho. Recomeço ainda menos confiante de concluir a empreitada com sucesso. Arrisco e escolho as primeiras palavras. Um arranque demasiado banal, aplicável a qualquer pessoa. Mas eu quero muito que seja para ti. 

Por isso, as palavras têm de ter o tamanho exacto para que só te sirvam a ti. Enquanto faço experimentações no provador, o tempo vai divagando. Resolvo a questão com alguns alfinetes da memória e uma bainha de afectos. Vou cosendo o pensamento ao papel, com mais desenvoltura.

Não o volto para o espelho, porque sei que a imagem sairá distorcida. E antes de colocar o derradeiro ponto final, abro um parênteses e meto a minha incapacidade expressiva nele.

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