Uma autobiografia interessante

16:17

Há já uns tempos li um livro que, hoje, me lembrei de vos sugerir. O título é “Até logo, tristeza – autobiografia de uma depressão”, da Colecção “As mãos e os frutos-testemunho” da Ambar. Eu escolhi este livro porque nunca dei muito crédito a esta doença que é a depressão e acabei por procurar no livro alguns esclarecimentos sobre essa realidade que eu desconhecia ter uma dimensão tão profunda. A autora do livro é Assumpta Roura.

Para vos deixar com alguma ideia, escolhi algumas citações representativas de uma história real, escrita com a pena do sentimento, em resultado final da experiência do vivido.

“A modernidade exige solidão. E a solidão antiga dos desertos encontra-se agora nas grandes cidades. (…) Por isso é necessário converter essas grandes cidades em grandes desertos povoados.”
(pensem na quantidade de vezes que precisam de companhia e só vos resta o barulho dos carros que passam ou o ruído das conversas cruzadas da rua que vigiam da vossa janela)

“Como vivemos submetidos à lei da selva, que não admite perdas de tempo em manifestações sentimentais.”
(inteiramente verdade... o que reina é a lei do mais forte emocionalmente...)

“Cada homem é obrigado, no decurso da sua breve vida, a escolher entre a esperança infatigável e a prudente falta de esperança, entre as delícias do caos e as da estabilidade.”
(é mais fácil, conveniente e estável não correr riscos que impliquem mais probabilidades do que certezas)

“Cada qual é o que faz.”(Lacan) Talvez se trate disso, de escolher o que se faz a cada instante, sabendo que por trás de cada opção se escondem milhares de renúncias cuja tranquilidade ou amargura nunca teremos oportunidade de saborear.”
(é a dicotomia das escolhas que nos obriga a decidir os caminhos que percorremos e a determinar aqueles que ficarão por percorrer)

“Com os teus olhos de sempre não te vês bem. Para te apreciares, o que deves perder é a recordação de ti próprio.”
(para uma auto-avaliação correcta era suposto que assim fosse, mas infelizmente a avaliação dos outros é aquela que consegue ter mais peso...)

“Muitas pessoas insistem em ser tudo uma questão de vontade. Mas de nada serve a vontade, se primeiro não se tomou consciência das razões por que temos necessidade dela.”
(ter falta de vontade e não perceber a que se deve...)

“Um homem que desconheça o significado do medo é uma companhia muito mais perigosa que um cobarde.”
(os corajosos só o são porque venceram o medo e para vencê-lo há que o ter enfrentado)

“Não tem uma depressão quem quer, mas quem pode. É preciso coragem para suportar a derrota, depois para reconhecê-la e administrá-la. Mas não se trata da coragem convencional, mas da coragem da insolência. Sou capaz de matar-me para voltar a nascer.”
(acho que estas palavras dizem o essencial...)

“Sabe-se lá se me guardam na lembrança com a mesma intensidade com que eu continuo a recordá-los. O mundo das relações é uma trama de subjectividades na qual qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência.”
(nunca sabemos exactamente até que ponto somos importantes para alguém ou o que representamos para os outros)

“O tempo ensinou-me a não desdenhar de nada do que fiz, ou disse, estivesse catalogado como bom ou mau, porque a soma de todos esses factos sou eu.”
(afinal aquilo que fizemos ou deixamos de fazer determinou a nossa maneira de ser, de agir, de pensar, de sentir)

“Um amigo atraiçoa-nos e sentimo-nos profundamente feridos. Mas ainda nos resta a força necessária para arrancar aos sentimentos uma investida: o rancor, a vingança, o ódio ou a esperança de uma reconciliação. Um dia, conhecemos o sabor do fracasso mas resta-nos o direito à renúncia ou a força para começar de novo. Sempre que o amor nos abandona, na solidão restam as lembranças e, sobretudo, o saber de onde procede a dilaceração interior. Algumas vezes sente-se medo e vencemo-lo ou ignorámo-lo. Outras, a tristeza chega e instala-se cá dentro como um hóspede ingrato, existem milhares de razões para estarmos tristes e existe a tristeza sem que haja qualquer razão. Saber isso é, já de si, razoável. Existe então a possibilidade de procurar consolo ou de evitá-lo. De qualquer forma, sabemos que a decisão nos pertence.”
(o mais difícil é mesmo tomar essa decisão...)

“Era como se me tivesse desintegrado por dentro, embora conservasse o invólucro.”
(quantas vezes conservamos o invólucro?!)

“Sente-se profundamente triste e não encontra motivo para isso? Tem vontade de chorar? Chora sozinho? Não consegue conter as lágrimas diante dos outros? Nota um cansaço excessivo e uma preguiça invencível? A menor tarefa que antes considerava rotineira, como vestir-se, lavar-se, escrever uma carta…implica agora um esforço esgotante? O acordar converteu-se todos os dias num momento muito amargo? As diversões que apreciava deixaram de apetecer-lhe? Evita os seus amigos porque não lhe compensa o esforço de manter a fachada? Tem insónias e passa horas acordado mergulhado em pensamentos negros? Gostaria de ficar na cama de manhã, com a luz apagada, sem fazer nada, sem ver ninguém?”

Quando puderem não deixem de ler esta autobiografia!

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