Nos passeios da cidade grande

08:40

Já não somos capazes de ir pelas ruas concentrados nos pensamentos que se imiscuem no barulho do trânsito, no toque da multidão nos passeios apertados, nas cores dos semáforos, no tagarelar circunstancial dos conhecidos que se cruzam.

Vamos andando por aí, agarrados ao telemóvel, a falar com alguém distante ou que já está mesmo ali, ao virar da esquina. Teclamos quase automaticamente e enviamos mensagens até perdermos a conta. Caminhamos em silêncio, mas já não ouvimos o movimento natural das ruas apinhadas de gente, porque levamos headphones para ouvir a música do MP3 ou para ficar a par das informações. De máquinas fotográficas em punho, estacionamos no passeio e reagimos ferozmente quando alguém reclama ou nos empurra sem intencionalidade. Temos a necessidade de andar pelos passeios e, em paralelo, realizar qualquer actividade “compatível”. Caminhamos abstraídos do que nos rodeia...

Não queremos saber das horas que o sino toca ao longe. Não importa o som das buzinas dos automóveis que têm pressa. Hoje nem sempre reparamos no carro que passa mesmo quando o vermelho cai. Já não ouvimos o choro da criança que vem na nossa direcção, pela mão do pai, a fazer birra. Não retribuímos o sorriso de quem, por cortesia, nos agradece quando nos desviamos para deixar passar porque vinha carregado com sacos ou malas. Não paramos para responder à idosa que nos pergunta as horas, porque seguimos abstraídos e surdos.

Quando as ruas se cruzam, as pessoas dispersam-se. Vamos afastando-nos do conceito de transeunte que facilmente se distraia com alguma coisa, mas atento! Atropelamo-nos, irritamo-nos e passeamos a nossa individualidade nos passeios estreitos apinhados de gente.

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