10:57

Cai uma chuva miudinha, mas não permito que ela me demova. Vou pegar na caneta, salpicar emoções e tentar despegar sentimentos. Quero estar apenas aqui, irrequieta no meio da imobilidade dos baloiços, a ouvir o rio correr bem perto e a sentir o peso das saudades do que nunca foi, do que julguei ser, do que nunca cheguei a restituir.

Fui aprendendo a ser assim: nunca desejar muito mais do que o que tenho, porque quando eu queria tudo e até esse tudo me parecia pouco e não chegava, pouco me foi permitido. À medida que deixei de poder dilatar perspectivas, tive que me sujeitar ao que a vida me tirou.

De repente, incomoda-me este chilrear dos pássaros em dia chuvoso. Distrai-me. Passa um pescador e olha-me de soslaio. Pudesse eu, de vez em quando, pescar suplementos anímicos para quando os ânimos desfalecem e se complicam.

Falta-me o alento como falta o sol a esta tarde nublada. Sei que ele está algures em mim. Como aliás nunca deixou de estar, mas hoje não desejo afastar as nuvens para o redescobrir. Hoje basto-me eu para mim, sem o que fui, com aquilo que restou daí.

E os dias vão passando e são horas vazias, cronometradas por uma tristeza silenciosa que corrói aquela velha, longínqua e saudosa alegria de lutar.

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