Ressonâncias

04:40

Pela janela, não mais do que o escuro da noite cruzado pelas luzes ténues dos candeeiros públicos. Do lado direito, à meia-luz, uma série de notas taciturnas num ambiente alegre. Por dentro, uma vontade dominada.

Queria sentar-me ali, com as pernas cruzadas à chinês, para apreciar, em contrapicado, o tamborilar de dedos esguios, nessa dança em que os polegares se cortejam à distância mínima de um toque.


Queria não ser mais do que um corpo pequenino, que ainda se deixa impressionar pela dimensão dos objectos. Um candeeiro solitário e altivo, um sofá grande e uma mesa enorme, num compartimento apertado.

Cá debaixo, no tapete fofo de cor morna, os dedos avançam, seguros e trémulos, sobem e descem a uma velocidade impressionante. Eles vão calcorreando o teclado, cujos suspiros abanam os sentidos de quem os escuta.

Num compasso aleatório, um desabafo espontâneo. Parece que existe uma dependência das partituras. Uma troca improvisada de sorrisos. Voltas a tocar, com paixão, e soltas-te, enquanto o meu coração esventrado vai acomodar-se, de mansinho, na cadeira vazia para se deixar cair nesse embalo melancólico.

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