Egoísmo doméstico

14:23

Não há qualquer registo de movimento na casa desocupada. Só as parcas mobílias atenuam o eco dos sons estridentes da televisão. Depois do telejornal, desligo o aparelho que se torna meramente decorativo.

Ainda não comi e a hora do jantar já passou. Talvez me fique por uns cereais ou um iogurte. Se calhar opto por um assalto à despensa e roube uma lata de atum e massas. O frigorífico mantém a água gelada e a fruta fresca, enquanto estranha a pilha de loiça suja que deixei acumular na bancada.

Percorro a sala descalça. Penso em escrever, ler, criar, mas não passam de impulsos, cuja validade se esgota no minuto seguinte. Estico-me na cama meia desfeita e sinto-me bem com o facto de não ter nada para fazer nem da vontade se dirigir nesse sentido.

Reparo no dia que acaba lá fora. O pedaço de céu, recortado pelos prédios altos que se vêem da janela do meu quarto, tem tons quentes e agradáveis. É nessa suavidade do horizonte que projecto a serenidade que espreita pelas esquinas da alma embrutecida.

Ouço o elevador subir, descer. Não espero visitas. Prefiro não ter companhia, porque afinal tinha saudades de me sentir assim, como uma eremita dentro de quatro paredes.

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