Entrai!

16:38

Empurram a porta, às vezes, sem incomodar o botão da campainha. Entram, atrevidos e prazenteiros, como se a casa fosse sua. Testemunham refeições, perturbam a execução de tarefas domésticas, interrompem leves sonos. Contudo, são sempre bem recebidos. E não há técnica de fidelização mais eficiente que esse acolhimento tipicamente transmontano.


«Para início de conversa, apenas dizer, que na minha casa havia Nova York em hora de ponta e que na soleira da porta Marrocos espreitava os halls nas Tailândias e que pelo corredor Marraquexes, Bagdads, Beirutes, Cairos, Damascos, Babilónias penduravam-se em bengaleiro talhado a madeira senegalesa. Convido os amigos, com certeza, muita certeza, para na sala tomarmos uma Escócia com dois ou três pedras de gelo nórdicas. Fantasmagóricas Islândias, metódicas Suécias, caóticas Rússias, módicas Finlândias, caleidoscópicas miscelândias, etc’s puxando Irlandas cheirando a fadas. Outras formas de encerrar os nadas. À boa velha maneira europeia, na cozinha waterlooiana, Franças e Inglaterras degladiam-se presunçosamente pelo dever das panelas fingindo não compreender que os tachos refugam-se Italianamente: por Roms, cebolas, Milões, alhos, Florenças, tomates, Venezas, sais, Siílias, azeites, Sardenhas e Toscânias com louros alentejanos. Cantando a caminho dos quartos, seria a tranquilidade Tibetana não fosse os pesadelos de Angola lembrar que a sanita está entupida de American ways lifes, faltam autoclismos, mecanismos que lhes dêem vazão. Quanto ao sótão, é um segredo alemão. Não falemos mais nisso. Para finalizar, apenas dizer, que à varanda está um aceno de mão transmontano que vos convida a entrar.
Entrai, por favor, entrai
Fazei de conta que é
Vossa, a casa.»
Jorge Serafim, in “A Sul de Ti”

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