Multidão

14:52

Desci a rua para sentir o fervilhar da indiferença das gentes que se cruzam, todos os dias, por aqui. Vêem-se, mas não se olham. As pedras da calçada ecoam os passos apressados. As fachadas dos prédios decrépitos ribombam a cacofonia de vozes agitadas. Parecem todos empenhados em fazer barras nos ponteiros dos relógios. Quanto mais fizerem naquela hora, mais tempo lhes sobra. Porém, na hora seguinte, vão sentir o mesmo e assim sucessivamente, até não haver tempo algum. E no pouco que houver, vão gastá-lo a planear o tempo que há-de vir. Se esse nunca chegar, o relógio avariou. Se essa multidão que baila na rua cronometrasse as paragens, perderia a noção de tudo ser uma linearidade em esfera, na qual nunca sabe de que princípio parte. 

(imagem retirada da Internet)

Sigo pela mesma rua e sorrio. Tenho a certeza que nunca chegarei a lugar algum que me satisfaça, mas não me exaspero com isso nem me iludo a respeito da remota possibilidade de ser diferente. Consegui aprender a brincar ao esconde-esconde com o relógio. Uso o ponteiro das horas, porque é maior, para me baloiçar e o dos minutos para me esconder. Arrasto o tempo, faço dele plasticina e giro pelos dias alegre e jovial.

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