De gosto

16:37

Gosto da luz da tua sala, neste estertor da tarde preguiceira. Gosto dos meus cabelos despenteados no reflexo do ecrã do computador. Gosto desta paz de domingo a meio da semana. Gosto desta luminosidade que viaja de fora para dentro sem pertencer a qualquer um dos lados.

É da janela, com as persianas enforcadas, que vejo o senhor de cabelos brancos. Veste um robe acinzentado e da mão pende-lhe um pesado saco de plástico. Mora em frente e viu-o quase sem querer.

(imagem retirada deste blog)

Reparei apenas no vulto que espreitou para dentro da caixa do correio. Não retirou nada e acabou por fechar o portão atrás de si, com lentor. Procurou a chave num dos bolsos e rodou-a com calma.

Agarrou-se ao apoio do corrimão e subiu (ainda mais devagar) as escadas, uma a uma. Com esforço, percebi. De repente, apeteceu-me escrever-lhe uma carta. O conteúdo seria baseado nalguma das minhas histórias felizes e pediria, certamente, uma resposta rápida, como sempre acontecia no tempo em que ainda enviava cartas.

Depois, pensei: será que alguém o esperava em casa para partilhar o jantar? Faria sentido colocar um sobrescrito na casa do outro lado da rua? De repente, apeteceu-me até gritar-lhe da janela, como se fazia na minha aldeia, e convidá-lo a vir lanchar ou jantar connosco. Teria crónicas de outros tempos para nos deliciarmos antes da refeição terminada. E aposto que ostenta um sorriso sublime e pacífico.

Gosto das janelas de tua casa abertas e desta luz que me aquece as mãos dormentes…

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