Descrição matinal

01:18

São 8.45h da manhã. A calma da rua é perturbada por alguns carros que circulam apressadamente. Uma das vantagens de não viver em grandes centros urbanos é poder acordar o mais tarde possível, pois não se perde tempo em filas de trânsito intermináveis. Os pássaros ensaiam os seus cânticos matinais. O sinal passa a vermelho e passa uma mãe a puxar o filho para o levar ao ATL. Um velhote desce a rua, auxiliado por uma bengala que o ajuda a suportar o peso de muitos anos. O sol promete aquecer este dia que começou com uma brisa fresca e agradável.

Há uma tranquilidade estranha, um nervosismo pequenino, uma ansiedade típica que antecede todas as novas experiências. A noite de ontem foi terrível. As preocupações perseguiram-me em pesadelos e todas as tentativas para adormecer foram vãs. Debrucei-me sobre o cansaço e rezei pela chegada da manhã. Agora, aqui estou, ao volante de um carro mal estacionado, a observar quem passa e a esperar por algo novo. Tenho tempo de sobra para usar o meu pensamento desocupado e, então, lembro-me de uma frase que li recentemente no livro “A guardiã dos sonhos” (de Rani Manicka)… “As coisas assumem sempre um aspecto mais favorável sob a luz da manhã.”. Não sei, mas a manhã traz a esperança, traz um novo alento, traz um novo dia e com ele a possibilidade de haver luz para o iluminar.

De facto, o ar que respiro nesta manhã é tonificante; é como transportador de novas energias, incendiário de novos desejos, sonhador de tentativas diferentes. Podemos ter mil e um problemas durante o dia inteiro e parece que eles se intensificam e se revelam insolúveis, principalmente, com o aproximar da noite, porém depois de uma noite mesmo que mal dormida, há sempre um amanhecer e com ele uma nova luz que nos leva a olhar para os problemas com outros olhos. Assumindo novas perspectivas tudo nos parece menos doloroso e angustiante do que na noite anterior.

Li também algures que o problema não é o problema em si, mas a nossa atitude perante o problema e, além do mais, um problema é algo muito relativo. Um problema só é um problema enquanto não sabemos como resolvê-lo e o que para mim é um problema não o é para outra pessoa porque conhece a sua resolução (isto foi o que aprendi nas aulas de filosofia de 10º ano). Mesmo em relação às coisas boas da vida, elas adquirem uma beleza adicional à luz de cada manhã. É bom ver o despertar de alguém que amamos, o seu ar despreocupado com a aparência, a lentidão dos seus movimentos; até o seu humor estranho é tolerável. É bom observar os raios solares despoletar no horizonte e apreciar as aves a rasgarem o céu. E é indescritivelmente melhor espreitar a nova manhã e acreditar que será o começo de um dia melhor que o anterior.

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