Justiça aguarda veredicto final

11:48

De norte a sul do país, a greve paralisou os tribunais. O governo faz “ouvidos de mercador” às reivindicações dos funcionários judiciais e avança com a requisição civil de oficiais de justiça, que pretende assegurar os serviços mínimos. Este facto trata-se, para mim, de uma manobra intimidativa para pôr um termo à greve e desrespeitar o direito dos funcionários judiciais à greve. Só que, ao contrário das expectativas, é capaz deste protesto ganhar ainda mais força. Serão legítimas as reformas que o governo intenta levar a cabo no sector da Justiça?

Os grevistas queixam-se da falta de funcionários, das más condições de trabalho, da falta de formação e da escassez do equipamento informático. Mas isso são os frutos de vários problemas estruturais. Se não vejamos: relativamente à falta de formação, todos os cursos de Direito têm uma grave carência – a ausência de uma componente prática. A excessiva carga teórica desta licenciatura faz com que, no final dos cinco anos, os recém-formados saiam completamente impreparados da faculdade. Em consequência, o mercado de trabalho acolhe pessoas sem experiência nenhuma.

A burocratização na área da Justiça contribui determinantemente para a demora dos processos. Embora já haja casos onde se começa a digitalizar a informação (como por exemplo, o Tribunal de Mirandela), eles são apenas pontuais e dificilmente se vão generalizar. A digitalização facilita o trabalho de arquivo, consulta e análise da informação, economizando tempo e acelerando o andamento dos processos. O principal entrave que se ergue à utilização do equipamento informático é a falta de qualificação por parte dos utilizadores, que na sua maioria possui conhecimentos parcos. A solução passa por ministrar cursos específicos aos funcionários judiciais que lhes garantam uma boa formação e, assim, possam vir a ter um melhor desempenho nessa área. A falta de equipamento informático resolve-se ainda com uma maior investimento estatal na aquisição de computadores. Já a falta de funcionários obriga a considerar a possibilidade de abrir mais vagas e, também, a eventualidade de baixar os níveis de exigência no acesso às profissões judiciais.

A redução das férias judiciais não vai acabar com a morosidade dos processos em tribunal. A palavra de ordem é: fiscalização. O governo deve legislar no sentido de criar comissões de avaliação que averiguem a produtividade dos tribunais. É necessário apurar a ineficácia dos seus trabalhadores e, depois, introduzir medidas que contrariem essa tendência e fomentem a eficácia dos seus profissionais. Os juízes, os oficiais judiciais, os trabalhadores de notariados e conservatórias e até aqueles que estão à frente dos tribunais superiores têm mais tempo de férias do que qualquer outro trabalhador, por isso mesmo que haja essa diminuição não será de todo descabida. E se os profissionais da Justiça gozam de um prestígio social elevado e incontestável devem justificar na prática se são ou não merecedores dele.

A verdade é que nunca se assistiu a uma greve que atingisse a dimensão desta, talvez porque nunca os que contribuem para a Justiça deste país tenham tido uma consciência de classe tão ciente da força da sua união como agora. Mas é urgente chegar a um consenso. Não é preciso acabar com alguns dos privilégios do estatuto sócio-profissional dos magistrados, basta diminui-los. As medidas que o governo prevê para a Justiça só pecam, na minha opinião, por serem tardias. É óbvio que a Justiça Portuguesa não vai tornar-se mais rápida de repente, mas, pelo menos, começa a ter meios para o ser a médio-prazo. Neste processo, onde o governo de Sócrates é o principal arguido, resta esperar para saber para que lado penderá a balança da Justiça.

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