Circunscrevendo

08:32

No tempo que nunca nos pertenceu, havia risos esquecidos nos teus lábios e alegrias apagadas no olhar. Das tuas mãos desapareciam as correrias à volta dos papéis reciclados e voltavas-te para mim, calmamente.

Nesse lugar a meia-luz, por entre dois copos altivos, de cristal frágil, e uma garrafa fresca, a música soava distante, quase em surdina. Cada qual num lado diferente da mesa, convictos de si. Estudávamo-nos mutuamente, depois das palavras. Julgávamo-nos realmente bons nisso e deixávamos o silêncio crescer entre o desejo controlado e a vontade desinibida.

Havia uma dialéctica camuflada. Nasciam duas linguagens a confluir numa voz. Tornava-se quase obsessivo despir as expressões que o rosto queria esconder. Procurávamos descortinar os múltiplos sentidos de um sorriso fugaz, de uns lábios contraídos, de um olhar saltitante.

Eram os detalhes dessas micro expressões que nos fascinavam por lhes desconhecermos o pleno significado. Víamo-nos como silhuetas recortadas em pedaços de papel de parede inestético e ríamos por dentro, porque nos conseguíamos ver mais além desse enquadramento.

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