Algumas pessoas caminham ao nosso lado por demasiado tempo, sem conseguirem entender que é preciso permitir que outros se juntem a nós. É dura a tarefa de aceitar e compreender que perdem a exclusividade numa área restrita.Quem chega de novo desconhece que será bombardeado com estranheza e desconfiança. Vencido o desconforto inicial, a guerra não declarada. De um lado, os moldes das antigas...
É na pastelaria centenária, bem centrada, que ele senta os anos numa cadeira da mesa redonda do canto. Usa óculos com um design contemporâneo, de cor preta, mas tudo o resto é da sua idade. Os tons escuros combinam com as cores da manhã abafada. Ele passa a manhã por aqui, possivelmente sem falhar um dia. Vai entretendo o tempo que tem, agora...
Avança sorrateira. Solta-se das barreiras da racionalidade. Ultrapassa o controlo. Cautelosa, invade e vai-se instalando. Até que, por fim, se acomoda como se já estivesse perfeitamente à-vontade em casa alheia.Como tentáculos opressores, ela agarra a tua segurança e explora as suas brechas, dilatando-as paulatinamente, quase à passagem desesperante dos minutos. Percorre as teus dedos entrelaçados, o teu olhar de soslaio, as tuas pernas...
Foi num anoitecer frioNesse recinto animado,Que te encontrei vazio.Quando te atirei palavras como penasTu sentiste-as como pequenas pedras.O teu olhar vidrado estilhaçou-me o escudoE eu culpei-me por quebrar o silêncio mudo.Essa fragilidade num corpo de meninoDevolveu-me uma impotência galopante...Próxima, a voz maternal repelia o desespero gritante,O medo de um profundo desatinoPor te perderQuase sem saber.Ao teu lado, senti-me mais pequenina,Mais fraca, mais egoísta,...
Desembarcámos no mesmo porto desabrigado, colhido pelas tempestades serenas. Regressámos em tempos distintos, ainda que aportados no mesmo estado de espírito. Não tínhamos ninguém à espera para nos abraçar as esperanças de um porvir melhor. Queríamos salvar os sonhos vilipendiados e espezinhados. Trazíamo-los, por isso, agarrados a uma bóia esvaziada.Não pensávamos em partir para novas paragens, porque tínhamos sido náufragos à deriva, sem...
No tempo que nunca nos pertenceu, havia risos esquecidos nos teus lábios e alegrias apagadas no olhar. Das tuas mãos desapareciam as correrias à volta dos papéis reciclados e voltavas-te para mim, calmamente.Nesse lugar a meia-luz, por entre dois copos altivos, de cristal frágil, e uma garrafa fresca, a música soava distante, quase em surdina. Cada qual num lado diferente da mesa, convictos...