René Magritte Enquanto a manhã despe o orvalho, os nossos pés continuam entrelaçados nesse sono descansado. O silêncio da rua atravessa as paredes coloridas do prédio e instala-se no cantinho empilhado de livros confusos. Acordo com a tua respiração minimal e lá vem, enfurecida e repentina, uma enxurrada de pensamentos. Trazem-me as incertezas desvairadas, encolhendo a esperança. Volto-me para ti e desejo que...
Um dia, também quero ter desses papéis amarelecidos, de pontas redobradas e caligrafias delicadas. Esses pedaços de papel vão imortalizar momentos e afectos de tempos em que fui feliz. O cheiro das folhas, entalado entre livros de vulgaridades ou em caixas secretas, trar-me-á o perfume inebriante da juventude. Sim, quero ter uma caixa atafulhada desses fragmentos biográficos intransmissíveis. Quero-os para que, nos ocasos...
Nas contas do destino, ele facturou e endividou-se. No ajustar dos números, o saldo pende para o positivo. Sempre viveu nessa vaidade vociferante de fazer as coisas respeitando a dignidade das transacções, honrando a honestidade dos negócios. Contudo, sempre viveu acima dos sonhos, em chãos falsos, pisando areias movediças. Um dia, sem dar conta, caiu e bateu no fundo. Sarapantado, olhou à volta,...
Ontem apeteceu-me interromper a viagem. Desejei não ter que levantar a âncora e esquecer-me das coordenadas distorcidas que os outros me impõem. Quis ficar ali, só até que as vagas do tumulto diário amainassem. É que ali, algures onde o mundo começa, o tempo tem o ritmo que acerta os reencontros e a vida parece só saber correr de feição. Ali, o telemóvel ou a...